VIDA RURAL
Recuperar as variedades tradicionais de fruta portuguesa
Há mais de 100 variedades de maçãs identificadas na região do Minho que são praticamente desconhecidas e muitas em vias de extinção. Raul Rodrigues, professor na Escola Agrária de Ponte de Lima, está há 10 anos a recuperar este património e a plantar todas estas variedades regionais, num um pomar com cerca de 1000 árvores que serve de base para o seu trabalho experimental. O próximo passo é replicar este trabalho numa outra fruta: as peras.
Já são mais de 100 as variedades de maçã identificadas na região do Minho. A grande maioria é desconhecida dos portugueses. São árvores, muitas em vias de extinção, que guardam tradições e histórias das terras minhotas. Abandonadas, como tem sido apanágio de muitas culturas em Portugal, as variedades de maçã do Minho oferecem potencialidades gastronómicas, culturais e económicas.
Raúl Rodrigues, professor da Escola Superior Agrária de Ponte de Lima, tem sido um acérrimo defensor deste património. Há cerca de dez anos começou um trabalho de levantamento e catalogação das variedades regionais de macieiras do Minho. Percorreu a região, conversou com as gentes locais, fotografou as árvores, registou as coordenadas e recolheu o material vegetal. Tudo com base numa pesquisa altruísta de fim-de-semana. Atualmente tem plantadas mais de 100 espécies regionais de maçã num terreno da ESA de Ponte de Lima. Mais de metade está já registada aos níveis morfológico e fenológico.
Valorizar o património
As maçãs do Minho têm nomes tão particulares como Porta da loja (porventura a mais conhecida e com mais potencialidades económicas), Pipo de Basto, Três ao prato, Sangue de boi, Victória, Camoesa, Malápio, maçã dos Namorados, Beijo da rainha, maçã da Boa vontade, Abadia, entre muitos outros. Junto com as designações populares trazem histórias e lendas. A maçã Três ao prato deve o nome ao tamanho, grande ao ponto de três maçãs encherem um prato. A maçã Camoesa (há a de Coura, do Biribau, Rosa, Verde, Fina e outras mais) era apanhada em setembro ainda verde e colocada a amadurecer no cimo dos armários, perfumando o interior das casas. Há a maçã da Abadia, que amadurece em agosto, por altura da Nossa Senhora da Abadia.
Maçã porta da loja |
O trabalho deste professor já se materializou na criação de uma pequena empresa em Ponte de Lima, constituída por duas antigas alunas da ESA. As jovens empreendedoras apostaram na produção de sidra artesanal, recuperando a tradição desta bebida que era fabricada pelos agricultores limianos para celebrar as colheitas, quando já não restava vinho nas pipas. A Corrupia, marca desta sidra artesanal, já foi agraciada com a medalha de prata no VI Salão Internacional de Sidras de Gala, em Espanha, na classificação de sidra de mesa semi-seca. As jovens empreendedoras aproveitaram o elã do prémio e, pouco depois, lançaram no mercado um espumante de sidra. Uma das prioridades da Corrupia é exactamente dar um uso económico às variedades regionais de maçã. Um dos projectos é produzir um lote especial de sidra só com maçã Porta da loja.
Raúl Rodrigues salienta que há outras soluções para obter valor acrescentado com as maçãs minhotas. Recuperar a tarte de maçã Porta da loja, a produção de pão com fermento desta variedade, a comercialização da maçã desidratada… Todo este potencial está a ser trabalhado na ESA, com o pomar de mil árvores que serve de campo de experimentação ao professor e aos alunos. As variedades são também estudadas tem em vista a sua aceitação no mercado, seja para consumo a fresco seja transformadas. A ESA, em conjunto com a Universidade de Trás dos Montes e a Universidade do Minho, estão também a fazer a caracterização genético molecular das macieiras regionais.
Novos projetos
Ao mesmo tempo que aguarda a instalação de um sistema de rega automático no campo experimental da ESA, Raúl Rodrigues já preparou um terreno para a plantação de variedades regionais de pêra. Neste momento, já fez o levantamento a mais de uma dúzia de variedades de pêras e tem já referenciadas mais de 40, que é só ir buscar para enxertar. O trabalho seguirá os mesmos passos que o feito com as maçãs.
E também com estas árvores de fruta não tem dúvidas. Há viabilidade económica. O exemplo é o Gin tinto, o primeiro gin tinto do mundo. Esta bebida, lançada no mercado em 2015 pelo empresário de Valença João Guterres, é produzida à base de 14 ingredientes e um dos que garante mais autenticidade é o perico de Fontoura, uma pereira singular, que é vendida a 5 euros o quilo e que está quase esquecida no Minho e em risco de desaparecer. Mas há mais, a diversidade varietal é grande. Há a pêra D. Joaquina (ou de água), a Amorim, a Arratel, de Lanhezes, a Bojarda, a Porta de Forno…
Esta região portuguesa guarda ainda duas variedades únicas de laranjas: a laranja de Amares e a laranja do Ermelo. O património é vasto e algum já perdido. Em tempos idos, foram identificadas 11 cerejeiras em terras minhotas. Na ESA, a colorir o jardim, encontra-se uma árvore de lima doce, tipicamente portuguesa, que Raúl Rodrigues quer reproduzir.
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